quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Segagaga - Um jogo muito estranho



  Não é segredo pra ninguém que eu gosto de videogames. Nem é segredo que eu gosto da Sega.
  E talvez por isso, enquanto o filme “Detona Ralph” faz a maioria das pessoas se lembrarem de seus bons tempos de fliperama, no meu caso, o que me veio na cabeça foi provavelmente o game mais maluco que eu já joguei na minha vida.
  Não só um jogo maluco, é um jogo japonês maluco. E digo mais, um jogo que foi considerado estranho no Japão – e caras, é preciso ser muito esquisito pra ser considerado estranho na terra do Godzilla.


 E é por isso que ele é divertido, e é por isso que vou escrever esse que periga ser o texto menos lido da história desse blog (e a briga é boa!). Um texto sobre um Simulador de Sega: Segagaga.



O terrível mundo das corporações

‎"Desenvolver games é um trabalho difícil, que requer pessoas especiais. Os níveis de estresse chegam a ser sobre-humanos, e tornam as pessoas violentas, ao ponto de terem que ser encarceradas. Mas nós precisamos de bons games, essa é a triste realidade desta indústria.

Ninguém de fora coloca os pés na sala de desenvolvimento fazem mais de vinte anos! Portanto, ninguém sabe exatamente o que acontece lá dentro... Tudo o que sabemos é que de vez em quando eles nos dão um game pronto em troca de comida e água. "

Bem vindos a uma inusitada (e de certa forma sádica, premonitória e genial) trama Seguista, ou não. Estamos em um futuro não muito distante onde a fatia da Sega no mercado de games caiu para míseros 3%. O mercado foi dominado por uma gigante chamada “DOGMA” (que nada mais é do que uma paródia da Sony e o seu Playstation 2). A Sega corre um sério risco de sumir do mapa dos games e para evitar isso, recorre a um plano ousado: Escolher alguns nerdinhos na rua para ajuda-la a mostrar os rumos certos!

Sabe-se que quando a ideia desse game surgiu, o responsável por ela, Toz Okada, foi ridicularizado e tomaram tudo como uma grande brincadeira, uma piada da parte dele. Porém, quando o game foi lançado, já em 2001, o cenário era assustadoramente parecido com o proposto pelo jogo. No final, acabou saindo como uma piada da Sega com a sua própria situação real – o futuro não muito distante a qual o jogo se referia, realmente estava pertinho.

No game, você é Tarou Sega, um dos moleques sequestrados escolhidos pela Sega para salvá-la através do chamado projeto Segagaga. Bom, até aqui, era apenas um game com uma proposta diferente. Daqui pra frente, ele fica bem esquisito mesmo.

A citação que eu mencionei acima, sobre a sala de desenvolvimento, acontece bem no começo do jogo, pouco depois que o pequeno Tarou descobre que aquelas portas reforçadas não estavam lá pra impedir os intrusos de entrar, e sim, para impedir que os perigosos programadores saíssem da sala. Mas é óbvio que fazer a Sega renascer é um trabalho que passa pelos desenvolvedores de jogos, então, o menino precisa entrar nas salas e botar ordem na casa.

Essa primeira parte do jogo é bem parecida com um RPG, onde você andar por “dungeons” (no caso, as salas dos desenvolvedores), enfrentando inimigos em batalhas no esquema de turnos. Mas não são batalhas comuns, não, não, não!  Ao invés de atacar com uma espada ou magias, os “ataques” de Tarou consistem em simplesmente gritar para os desenvolvedores as coisas que eles não querem ouvir. “Volte ao trabalho, seu preguiçoso!”, “Você nunca conseguirá uma namorada!”, “Você acha que alguém vai comprar essa droga de game?” estão entre as poderosas ofensas bradadas pelo nosso herói para colocar as coisas sob controle.

"Chopin The 3rd
Seus inimigos, aliás, são tipos bem estranhos. Mas bem estranhos. Eu disse estranhos? Preciso de outra palavra.
Embora sejam sempre batalhas de 1 x 1, cada tipo que você encontrará tende a vir acompanhado de suas manias ou loucuras. Por exemplo, não bastará dar cabo de um programador alcóolatra: Terá que se livrar de suas garrafas também! Isso pode ser muito mais tosco do que parece, espere só até ver os gráficos desses carinhas – e tosco, nesse caso, pode ser um adjetivo muito bom ou muito ruim, depende da maneira como você vê.

 Acreditem em mim: Assim que terminar a primeira batalha você terá entendido muito bem o porquê desse game nunca ter sido lançado fora do Japão, e estará prestes a desligar seu precioso Dreamcast. Mas continue no game, seja firme. As coisas vão piorar pra melhor (e não, eu não falhei em concordância).
Como em todo RPG, você pode aumentar sua “party” se quiser. Basta pagar aos funcionários o que eles pedem – sim, esse game é governado pelo capitalismo. Há até um personagem que realmente personifica todo o capitalismo da indústria de games em si mesmo. “Games não são mais do que meros produtos! Você procura tendências populares, copia descaradamente, e assim ganha dinheiro!”, ele te dirá. Muitas empresas seguem essa lógica até hoje. 

Vamos brincar de Sega

Uma vez que os estúdios estejam dominados, você é introduzido à parte simulação do game. Sim, realmente há uma parte de simulação aqui! Bom, como posso explicar? Cada estúdio tem sete membros em seu staff: três programadores, três designers e um diretor. Cada um deles tem diferentes níveis de habilidade em várias competências, como por exemplo, criatividade, habilidade, etc. Cabe a você então delegar a eles a missão de... criar os games! É você quem toma as decisões aqui: Prefere que saiam muitos games bobos rapidamente, ou um só arrasa-quarteirão de vez em quando? Quer que eles trabalhem muito e percam produtividade pelo cansaço, ou será um chefe bondoso que dará folgas de vez em quando? Lembre-se que você não pode deixar que a So... Digo, a Dogma tome todo o mercado para si!
E se você for ousado o bastante, pode inclusive lançar o seu próprio console (que sonho!) e se fizer isso no timing certo, estará destinado ao sucesso.

Como em uma empresa qualquer, a vida dos seus funcionários interfere no trabalho. Se um deles se casar, por exemplo, todos da sala vão trabalhar mais felizes. Se dois caras na mesma sala não se gostarem, as coisas podem complicar. E assim por diante. É uma pena que você não possa decidir o mais importante, que são justamente os games que estão sendo feitos. Você só saberá algo deles quando já estiverem em suas fases alpha ou beta de produção (já já eu comento mais sobre esses games). Ah sim, você também vai passear por alguns lugares dos sonhos dos nerds e geeks em geral. Que tal uma voltinha em Akihabara?

Tanto como game de simulação, quanto como um RPG, Segagaga não é nada mais do que um jogo medíocre. Porém, a mistura dos dois é bastante interessante. Não que seja balanceada ou bem feita. Parece que simplesmente não conseguiram decidir como esse game seria e jogaram as duas melhores ideias nele. O resultado final, por incrível que pareça, ficou, bem, intrigante – essa é a palavra.

Prato cheio de saudade

O pulo do gato de Segagaga, no entanto, com certeza é o fan-service. E meus queridos jovens gafanhotos, eu preciso dizer uma coisa: Esse jogo tem toneladas disso. Mas toneladas mesmo.. E olha que produtores já falaram que cerca de 2/3 (!) das referências foram cortadas ou amenizadas para não ferir direitos autorais alheios e afundar ainda mais uma vaca que já estava atoladinha no brejo.

Ao longo dessa postagem, você pode ver diversos pôsteres de games. Esses games são os games que você estará produzindo em Segagaga! Sim, as paródias não se limitam aos jogos da Sega, e quero dar destaque à paródia do game “Lupin The Third”, que aqui é representado por “Chopin The 3rd”, e sim, Chopin, no caso, é aquele músico. É claro que os próprios games da Sega, no entanto, são as estrelas e os mais parodiados, e você chega inclusive a jogar alguns deles. Enquanto algumas piadas são bem óbvias (como por exemplo, Mortal Wombat) outras precisam de um pouco de conhecimento de japonês pra entender, como a paródia de Fatal Fury (chamado “Garou Densetsu” no Japão), que em Segagaga se tornou “Garou Dentetsu” (“Dentetsu” significa trem, e o “Terry” da capa do game está vestido de maquinista).

Mas em Segagaga, as influências estão por todas as partes. Desde coisas sutis como um personagem usando a jaqueta de Ryo Hazuki, de Shenmue, até outras bem mais explicitas. Alguém aí já imaginou como seria um desabafo de Alex Kidd, o antigo mascote da Sega, que foi colocado de lado e esquecido com a chegada daquele ouriço azul famoso? Bom, a aparição de Alex Kidd e a maneira como ele narra sua própria história de ascensão e queda, te farão sentir uma pontinha de pena, no mínimo. Pobrezinho.
 Sonic, Golden Axe, Ristar, Sega Rally, Phantasy Star, Samba de Amigo, Panzer Dragoon... Esses são moleza. Segaga revisita tantos games que desconfio que pelo menos 1/3 deles me passaram totalmente batidos simplesmente porque eu não os conhecia - e eu lhes garanto que conheço muitos games da Sega.  

Eu vou até dar um spoiler aqui, mas é um spoiler do bem: Senhoras e senhores, nos momentos finais desse game vocês lutarão contra os consoles da Sega em uma batalha no espaço. Sim, você vai usar uma espaçonave para trocar tiros com um Mega Drive e outros aparelhos afins, e não, isso não, isso não é tão ridículo, ou talvez, sim, é tão ridículo, mas, bom, eu sei lá! Quando você chegar nessa parte, seu cérebro provavelmente nem vai ver nada de errado com a cena. Estará tudo bem.

Bom, Segagaga é um jogo no qual ninguém acreditava, nem a própria Sega. Diz a lenda que o próprio idealizador do jogo teve que vestir uma fantasia e ir às ruas para vende-lo em certo momento. Supostamente, o projeto teria sido tocado sob sigilo dentro da própria Sega.
É um game de publico alvo restrito, mesmo no Japão. E é um game totalmente em japonês (há projetos de tradução rolando, mas nada está pronto até esse momento).

Mas vale a pena uma olhada, especialmente para saudosistas. A barreira da linguagem até pode desanimar, mas não há nada nesse jogo que um detonado online não resolva, pois é muito fácil compreender o que está acontecendo apenas observando as imagens.
A verdade é que é um game bastante diferente. E o maior motivo para se jogar um game assim, é o simples fato dele existir. É preciso ter coragem para se aventurar num game japonês dessa natureza. Mas esse game dá aos fãs da Sega a chance de fazer aquilo que todos os fãs queriam fazer em 2001: Salva-la dos concorrentes. E de si mesma.  

Um comentário:

  1. Até que enfim esse post saiu! Escuto a falar desse jogo por você ha anos!

    Depois que li o texto e refleti, me impressionei pelo tempo em que ele foi feito e me admira muito que hoje em dia não se façam mais jogos assim, ainda mais hoje que a rivalidade foi deixada de lado e que apenas o lucro é importante.

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