segunda-feira, 9 de maio de 2011

Roberto Baggio


  Já diz o provérbio chinês de 5 mil anos de idade: “O maior problema da vida, consiste em não haver nenhum tipo de Memory Card onde você possa salvar os momentos cruciais, para tentar de novo quantas vezes precisar”.

Ok, esse provérbio não existe (tecnicamente, agora existe, só não é chinês), mas define bem o que muitas pessoas sentem em várias situações da vida. Sabe aquele momento que você sempre esperou? Sim, aquele que estava nos seus sonhos desde pequeno. Aquele que será único. Aquele que você cometeu um erro. Aquele que marcou sua vida pra sempre. Aquele que nunca vai sair dos seus pesadelos. Pois é. Esse.


"É uma ferida que nunca vai se fechar. Sempre sonhei disputar uma final de Copa do Mundo e o rival dos meus sonhos era o Brasil. Quando tive a oportunidade, desperdicei aquele pênalti.”


A frase acima é de Roberto Baggio. Caso você não lembre dele, eu vou refrescar sua memória com outra frase:

Partiu, Bateu... Acabou! Acabou!! Acabou!! É tetra! É tetra! É tetra!!!”

Lembrou? Tenha você lembrado ou não, a vida de Baggio não se resume a apenas um penalti desperdiçado. O que mais há de se falar sobre ele? Muita coisa. Afinal de contas, um jogador italiano que passou a infância adestrando ornitorrincos surdos, tem muita história pra contar...


Gênio precoce

Não fiquei maluco, diz a lenda (como muitas outras do futebol, que não sabemos, nunca saberemos e, de fato, nem queremos saber se é verdade ou não) que o hobby de Roberto Baggio quando ainda era um menino consistia em adestrar ornitorrincos surdos. Tudo bem que não faz muito sentido adestrar ornitorrincos, assim como também não faz muito sentido que um menino de Vicenza, na Itália, tenha contato com esse tipo de animais...

Uma coisa é certa: Baggio já destruía os adversários naquele tempo. Na categoria de base do time da cidade, era o terror: Conta outra lenda, que em seu primeiro campeonato teria marcado 50 gols. Em apenas 11 jogos...

Fã de Zico e do ex jogador do Palmeiras, Chinesinho, na época jogador do Vicenza, Baggio sempre demonstrou uma habilidade formidável, sendo inclusive apelidado de Zico pelo seu primeiro treinador. Estreou no time profissional aos 16 anos de idade. Aos 19, levou o time ao título da divisão C1 do campeonato italiano, e ao acesso a divisão seguinte. Chamou a atenção de vários clubes, e foi parar naquele com o qual mais se identificou ao longo da carreira, a Fiorentina

O ídolo de Florença

Na “Viola” (apelido da Fiorentina), Baggio se tornou um dos principais jogadores não só da Itália, como do mundo. Gols, frequentes e muito bonitos, frutos de uma qualidade técnica raríssima na história do esporte, fizeram dele uma unanimidade. Não imediata: Levou quase 2 anos para realmente mostrar seu futebol por lá, devido a uma lesão séria que sofreu, ainda antes de apresentar-se no novo time, o primeiro grande revés de sua carreira.

Durante seu período de recuperação, aliás, destacam-se três pontos distintos que o acompanhariam ao longo de sua vida: Em primeiro lugar, o joelho contundido, que jamais voltaria a ficar 100%. Em segundo, mas não menos importante, seu comportamento sério e o profissionalismo: Sequer era visto saindo de casa naquela época. Evitava sair para que a mídia e as pessoas não duvidassem que estava levando o tratamento a sério. Em terceiro, a religião: De família católica, foi apresentado ao budismo por um amigo nessa época e se identificou. Segue a religião até hoje.

Baggio levou a Fiorentina até a final da Copa da UEFA da temporada 1989 / 1990, perdida para a também italiana Juventus. Mas a derrota não foi o segundo revés da carreira de Baggio, pelo menos não totalmente. Era apenas o inicio dele.

Velha Senhora

Tão logo a final acabou, Roberto Baggio foi transferido para a própria Juventus, por um valor record na época, e, dizem as más e boas línguas, contra a sua vontade. A torcida da Fiorentina ficou revoltada, foi as ruas protestar. Para se ter uma idéia do tamanho da revolta, pelo menos 50 pessoas ficaram feridas durante a manifestação... Alguns dirigentes da Fiorentina passaram a andar com guarda costas... E a família que era dona do clube, acabou vendendo a Fiorentina pouco tempo depois...

Mas Baggio também não foi recebido com sorrisos em Turim. Muito pelo contrário: A torcida desconfiava dele. E passou a ter motivos quando, em um jogo contra a própria Fiorentina. Baggio se recusou a cobrar um penalti contra o seu ex time. O jogador que cobrou no lugar dele errou, e a Juventus perdeu por 1 x 0. Para piorar a revolta, Baggio abraçou, às lágrimas, um cachecol da Fiorentina jogado no campo...

No entanto, as atuações brilhantes logo fizeram a torcida esquecer desse episódio. Eleito o melhor jogador do mundo pela Fifa em 1993, e vencedor da Bola de Ouro da revista France Football no mesmo ano, além da conquista do título italiano depois de 9 anos de fila, não deixava mesmo espaço para ressentimentos...

A seleção e o penalti fatídico 

Baggio é o único jogador italiano a marcar gols em 3 Copas do Mundo diferente, a saber, as Copas de 1990, 94 e 98. Fez, ao longo delas, atuações brilhantes. Foi convocado pela primeira vez em 1988. Na copa de 1990, apesar de reserva, chegou com a Itália até a semifinal, participando de quase todos os jogos e fazendo seus golzinhos. Foram eliminados pela Argentina de Maradona nos penaltis. Baggio acertou a sua cobrança.

Em 1994, Baggio chegou aos EUA como o Melhor Jogador do Mundo, e com a motivação de, um mês antes do início da competição, ter se tornado pai do seu segundo filho. Apesar dos desentendimentos com o treinador, fez grandes atuações, chegou a final como vice artilheiro (atrás de Romário), mas estava longe da sua melhor forma física. Baggio sofrera uma lesão na coxa ainda nas oitavas de final. Escondeu dos médicos enquanto pôde. Jogou a final na base de infiltrações, e ainda assim quase marcou um golaço, tentando encobrir Taffarel.

Não fez esse gol, assim como, debaixo de um sol escaldante, nem Brasil e nem Itália tiveram forças para abrir o marcador. A Copa seria decidida nos penaltis. Quando Baggio encaminhou-se para a marca fatal, a situação era a seguinte: Para a Itália ter chances, Baggio tinha que acertar sua cobrança e Bebeto errar a seguinte. Baggio correu e chutou, por cima, no momento mais marcante de sua carreira. Se a bola pudesse falar, provavelmente teria dito algo do tipo “Ao infinito, e além!”...

“Só erra um pênalti quem tem coragem de batê-lo. Naquele dia, decidi bater e errei. Ponto final. Faz parte do jogo. Aquilo me marcou por muitos anos e ainda sonho com isso. Apagar aquele pesadelo da mente foi difícil.”

“O ano de 1994 foi o ano em que o Ayrton Senna morreu. Eu jamais havia errado um pênalti daquele jeito, para o alto. E a bola partiu para o céu... acho que foi um presente para o Ayrton

“Na hora, quis cavar um buraco para me esconder. Depois, pensei que, como o Brasil tem muito mais habitantes que a Itália, eu fiz mais gente feliz com aquela cobrança

Definitivamente fez, Baggio...
Ele ainda disputaria outra Copa do Mundo, em 1998. Estreou sendo decisivo no empate por 2 x 2 diante do Chile, onde deu uma assistência e fez o gol de empate faltando cinco minutos para o fim do jogo. De penalti. A Itália seria eliminada diante da anfitriã França, na fase semifinal, novamente nos penaltis. Baggio foi o primeiro a cobrar e acertou.

Era nome quase certo para ir ao Japão e a Coréia do Sul para disputar a Copa de 2002, aos 35 anos, mas uma contusão frustrou suas chances.

A difícil vida em Milão

Depois da temporada de 1995, Baggio foi vendido para o Milan. Por lá, foi campeão italiano pelo segundo ano consecutivo. Em 1997, brigas com o treinador Arrigo Sacchi o fizeram ir embora de Milão, para jogar no Bologna. Uma temporada brilhante e 22 gols depois, estava de volta a Milão, desta vez para jogar pela Inter de Milão, arquirrival do Milan.

Na Inter, foi prejudicado pelas lesões, além do relacionamento também não muito agradável com o treinador Marcello Lippi. Some a isso a concorrência com um tal de Ronaldo, e o já veterano Baggio parecia não ter espaço naquele time. Acabou indo para o Bréscia, onde tirou o modesto time da zona de rebaixamento e o levou até o 7° lugar do campeonato. Nessa época, em uma dividida com o brasileiro Fábio Bilica, sofreu a lesão que o tiraria da Copa de 2002. Baggio jogou no Bréscia até 2004, quando se aposentou. Junto com ele, foi aposentada a camisa dez da equipe onde realizou seus últimos jogos. Baggio colecionou diversos recordes ao longo da carreira.

Em um país onde a defesa sempre foi mais importante que o ataque, ele é um dos pouquíssimos jogadores a marcar mais de 200 gols na Séria A italiana. Um dos poucos a marcar mais de 300 na carreira. Um dos poucos a jogar pela Juventus, Inter e Milan. É um dos 5 maiores artilheiros da história do campeonato italiano e, curiosamente, é o recordista em gols de penalti na competição.

No total, foram 318 gols marcados (76 de penalti), sendo 9 deles em Copas do Mundo e 205 pela Série A italiana. Eleito um dos 100 craques do século pela revista Placar, hoje ele dedica seu tempo ao seu novo hobby, caçar patos em sua fazenda na Argentina, e a dedicar-se a causas humanitárias. Certamente, muito melhor do que criar ornitorrincos (nada contra ornitorrincos...).

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