segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Entendendo os Buracos Negros


  O Universo está cheio de coisas. Tudo bem que em sua maior parte, o Universo não passa de espaço vazio, repleto de nada (e se essa postagem fosse sobre o “nada” você poderia acabar pensando que “nada” é alguma coisa, porém, isso não vem ao caso), mas as “poucas” coisas que estão espalhadas pelo Universo são muito mais coisas do que nós podemos imaginar e, por consequência, muito mais do que nós podemos entender.

Já descobrimos e entendemos algumas coisas bem malucas, estamos sempre descobrindo novas, e a cada dia percebemos que não, não havíamos entendido muito bem o que pensávamos ter entendido. E entre essas coisas que geram um constante entender e reentender, uma das mais fascinantes que conhecemos são os chamados Buracos Negros.

Mas o que são Buracos Negros? Como eles se formam e o que acontece dentro deles? É isso o que nós vamos entender (ou pelo menos tentaremos) ao longo desse texto...

A força das ondas

Antes de entendermos os Buracos Negros, precisamos entender, ou no mínimo ter uma pequena noção de como funcionam algumas coisas. À saber: A gravidade, a luz e as estrelas. Vamos por partes:

A gravidade ou força da gravitação é uma das 4 forças conhecidas no Universo (além dela temos a força eletromagnética, a energia nuclear fraca e a energia nuclear forte), e é também a mais fraca, ao ponto de ser praticamente nula em escala microscópica. É milhões e milhões de vezes mais fraca do que a força eletromagnética, por exemplo. Entretanto, como a gravidade é a atração exercida entre dois corpos, quanto maior a massa desses dois corpos, mais forte ela se torna, até chegar em um ponto em que a mesma fica poderosa o bastante para realmente repercutir na matéria em larga escala. E é por isso que, embora a gravidade seja uma força fraquíssima, o Sol consegue ter força gravitacional suficiente para manter os planetas em sua órbita, por exemplo.

Uma coisa importante sobre a gravidade: Supostamente, segundo a Teoria da Relatividade, essa força seria capaz de influenciar também o tempo e o espaço. E podemos medir isso com experimentos práticos. Sabemos, por exemplo, que quanto mais longe do núcleo da Terra nós colocamos um relógio, ou seja, quanto mais nós o afastamos do centro de gravidade, mais devagar movem-se os ponteiros. Pois bem.

Durante muitos séculos, dois debates agitaram a ciência, sendo que o primeiro questionava: A luz seria uma série de ondas, ou uma série de partículas? O tempo passou e descobriu-se que a luz na verdade era um misto de ambos, ou seja, tanto os cientistas que defendiam que a luz fosse uma série de ondas, quanto os que defendiam que ela seria uma série de partículas, estavam certos. O segundo debate questionava se a luz seria ou não afetada pela força da gravidade. Experimentos posteriores também mostraram que sim, a gravidade exercia efeito sobre a luz.

A luz é capaz de levar consigo a energia do corpo que a originou (em forma de calor, por exemplo) e por muito tempo acreditou-se que sua velocidade fosse infinita, até descobrirem que isso não era verdade. No entanto, embora hoje em dia haja um debate a até algumas evidências que digam o contrário, a velocidade da luz vem sendo aceita como uma espécie de limite de velocidade cósmico: Embora não seja uma velocidade infinita, (supostamente) nada pode ser mais rápido do que a luz.

Estrelas em colapso

Quanto às estrelas, precisamos entender duas coisas: Como elas se formam e o que lhes acontece (ou pode acontecer em alguns casos) quando elas “morrem”. Explicando de uma forma bem simplificada, estrelas são formadas quando quantidades realmente grandes de gases encontrados no Universo acabam reunidas pela força da gravidade. A gravidade continua a comprimir os gases até que suas moléculas fiquem tão próximas que começam a se chocar umas nas outras. Esses impactos geram energia, em forma de calor, que por sua vez tem um efeito dilatador, mantendo um equilíbrio e evitando que a gravidade continue comprimindo a matéria, estabilizando a estrela em seu formato.

O que acontece é mais ou menos como o que acontece numa bexiga: A borracha que forma a bexiga faz o papel da gravidade, tentando comprimir o que tem dentro dela. Mas o ar dentro da bexiga faz o papel da energia gerada pelas moléculas, ou seja, tenta expandir a bexiga. Quando paramos de inserir ar dentro da bexiga e fechamos a saída, a força da borracha que comprime se equipara com a do ar que expande e a bexiga mantem um formato estável.

Porém, se você foi uma criança cuidadosa e conseguiu guardar uma bexiga por algum tempo, sabe que o ar tende a escapar de pouquinho em pouquinho, até a bexiga murchar. Na Estrela, acontece mais ou menos isso: As fontes de energia (como o hidrogênio, por exemplo) vão se esgotando aos poucos, até que a gravidade começa a vencer a queda de braço e a Estrela começa a comprimir-se. É assim que a estrela “morre”. E o que acontece depois?

Como já foi dito, a gravidade não é a única força presente no Universo. Existem outras, como a força eletromagnética. Para que a força da gravidade seja superior a força eletromagnética dos elétrons, é preciso uma massa de pelo menos 1,5 vezes a massa do nosso Sol. Portanto, quando estrelas menores do que esse limite esgotam suas fontes de energia, elas são comprimidas até o ponto em que a força eletromagnética (que também tem forças de repulsão, como você pode atestar colocando dois pólos iguais de um imã quaisquer frente à frente) dos elétrons passe a impedir que a matéria aproxime-se ainda mais. Nesse ponto a Estrela atinge um equilíbrio e torna-se o que os cientistas chamam de Anã Branca.

Mas estrelas maiores conseguem ter força gravitacional suficiente para superar essa força eletromagnética que repele os elétrons. Essas estrelas esbarram em outro problema: A matéria pode ser comprimida “apenas” até o limite em que os elétrons são empurrados para o núcleo dos átomos, unem-se aos prótons e formam nêutrons. Esses nêutrons, por sua vez, tem sua contração limitada pelas forças nucleares, mantendo a estrela em um novo estado de equilíbrio. Esse segundo caso é chamado de Estrela de Nêutrons, corpos incríveis que comprimem massas imensas em um raio de apenas umas poucas dezenas de km. Mas e quanto às estrelas ainda maiores? É nesse ponto que entram os buracos negros.

O fundo do poço

Estrelas com massas ainda maiores podem vencer esse limite e continuar a comprimir-se. A gravidade comprime o que sobrou da estrela (e tudo o que estiver por perto) até um estado em que a quantidade de matéria concentrada num espaço incrivelmente pequeno faz com que a força da gravidade naquele espaço chegue à níveis absurdos, um ponto em que nada mais poderá escapar de lá, nem mesmo a luz. E é a esse tipo de corpo celeste que damos o nome de Buraco Negro (na verdade, existem outras maneiras, teoricamente, de um Buraco Negro se formar, alguns com massas muito menores do que isso, mas vamos nos concentrar nos que são formados por estrelas, por serem os mais fáceis de identificar).

Como você pode perceber, Buracos Negros não são buracos, tampouco são negros. Muito pelo contrário: Eles são corpos extremamente macivos e provavelmente bem brilhantes. Os chamamos de negros por conveniência, uma vez que por mais que brilhem, se a luz não for capaz de escapar ela jamais alcançará os nossos telescópios e muito menos os nossos olhos para nos contar por onde passou ou de onde saiu, e para nós o Buraco Negro será eternamente um pontinho preto dentro de uma xícara de café em uma sala escura, pelo menos até passarmos de uma linha chamada Horizonte de Acontecimentos. Espera: Horizonte de Acontecimentos?

Além do Horizonte

A luz não consegue escapar do Buraco Negro pois a mesma está limitada à sua própria velocidade. A força gravitacional de um Buraco Negro é forte o suficiente para impedir que a luz (que, como já vimos, está sujeita aos efeitos da gravidade) escape, pois mesmo a velocidade da luz ainda é insuficiente para vencer a enorme força da gravidade do Buraco Negro.

A luz pode chegar até um ponto chamado Horizonte de Acontecimentos, que é basicamente o limite do Buraco Negro, uma espécie de fronteira. Chegando lá ela tenta escapar, mas é puxada de volta pela gravidade. É quase como em uma partida de damas em que ambos os jogadores tem apenas uma peça restante (uma dama), e enquanto um está decidido a caçar, o outro prefere fugir: Eles podem ficar eternamente nesse ciclo, em que seus movimentos basicamente se anulam e os mantem empatados, a menos que um dos dois desista ou erre. Como nem a gravidade, nem tampouco a luz, estão dispostas a desistir ou sujeitas a grandes erros, a luz tende a ficar presa no Horizonte de Acontecimentos para Sempre, ou no mínimo enquanto o Buraco Negro existir.

Seria preciso, portanto, ser consideravelmente mais rápido do que a luz para conseguir passar pelo Horizonte de Acontecimentos e sair do Buraco Negro. Mas o que acontece lá dentro, além do Horizonte de Acontecimentos?

Singularidades

A primeira coisa que te aconteceria ao passar pela fronteira do Horizonte de Acontecimentos, muito provavelmente, seria... Morrer. Despedaçado. E muito bem despedaçado, por sinal. Isso porque a gravidade seria tão forte, que a diferença da força puxando os seus pés em relação a mesma força puxando a sua canela, poucos centímetros acima, seria o suficiente para separá-los, por exemplo. Aliás, provavelmente a diferença na distância entre cada átomo do seu corpo já seria o suficiente para separá-los...

Mas tudo bem, e se você não fosse “desintegrado” e não morresse, o que você veria? Bem, em primeiro lugar, é provável que você jamais notasse, mas o tempo passaria muito mais rápido para você. Mas muito, muito, muito mais rápido. Algo que você levasse alguns poucos segundos para fazer, como por exemplo, postar uma atualização no Facebook contando como estão as coisas (aproveitando que estamos assumindo a idéia fictícia de que você sobreviveria lá dentro, vamos fingir que você pudesse acessar o Facebook também), poderia levar a eternidade toda aqui fora. Ou seja, jamais receberíamos a sua atualização (pense nisso como a internet com a velocidade de upload mais lenta do Universo todo), mas você receberia todas as nossas, e isso te deixaria bravinho e faria você sentir-se abandonado pelos seus amigos.

Chega a ser confuso, na verdade, se o tempo passaria mais rápido para você, ou mais lento para nós enquanto te observássemos (parece, mas não é exatamente a mesma coisa). A diferença seria tamanha que enquanto nós, de uma nava espacial, observássemos você caindo no Buraco Negro, veríamos sua velocidade diminuir à medida em que fosse se afastando de nós, até que, em determinado ponto, você simplesmente pararia, e lá ficaria, por muito mais tempo do que nós pudéssemos acompanhar. Enquanto isso (ou não, essas coisas são confusas mesmo), se você sobrevivesse, bem, você provavelmente já estaria, minutos depois, atualizando o seu Facebook.
Além disso... Bem, além disso, é muito difícil dizer precisamente o que mais acontece nos Buracos Negros. Isso porque a própria existência de um lugar com massa infinitamente densa consiste em uma singularidade, e a Teoria da Relatividade e toda a física moderna não podem dar conta de singularidades. A simplês existência dos Buracos Negros em si já consiste em algo duvidoso para a ciência. Afinal, se nada, nem a luz, nem matéria, tampouco informação, podem escapar, como sabemos que eles existem?

Partículas Virtuais

Buracos Negros, nesse ponto, são quase como o vento: Você normalmente não pode ver, mas pode sentir. Um objeto tão maciço ao ponto de exercer uma gravidade tão fenomenal assim, certamente deve exercer influência sobre outros objetos próximos. E é o que acontece. Ou pelo menos, parece acontecer.

Em primeira instância, toda a nossa galáxia parece orbitar em torno de um gigantesco Buraco Negro, mais ou menos como a Lua orbita a Terra e a Terra e os outros planetas do sistema solar orbitam o Sol. “Parece”, pois ainda não se pode provar isso. Ainda.

Buracos Negros também emitem radiação e com isso vão perdendo, de pouquinho em pouquinho, o seu volume. Podemos então observar essa radiação fugitiva.
“Mas espera, se nada pode passar pelo Horizonte de Acontecimentos e sair do Buraco Negro, como essa radiação escapa?”, você pode estar se perguntando (se ainda não dormiu com o texto).

A resposta é algo ainda mais maluco e complicado do que tudo o que foi escrito até aqui, nesse texto. Envolve uma lógica bem doida e alguns cálculos e conceitos que precisariam de outra postagem (talvez maior) pra explicar em detalhes. Mas para sermos simplistas, como estamos fazendo desde o começo do texto: Existem as partículas reais, que formam toda a matéria. Essas são afetadas pela gravidade, e todas as demais forças. E em contraparte à elas, existem as antipartículas, que são mais ou menos o contrário das partículas. Quando partículas e antipartículas se chocam, ambas se anulam. É como se existisse um outro você, em outra dimensão. Se ambos, você e o seu “anti-você” se encontrassem, quando vocês dessem um abraço... Puf, vocês desapareciam. Algo assim...

Paralelamente, também existem partículas virtuais. Essas partículas não tem massa, e só sabemos que elas existem (ou acreditamos que existam) porque elas exercem influência sobre as partículas reais. Essas partículas formam-se sempre em pares (também de partículas e antipartículas) e por mais que influências externas (como a gravidade) possam fazê-las tornarem-se reais, tão logo isso ocorre, elas tendem a aniquilar-se mutualmente muito, muito rapidamente. Porém, como em princípio elas não tem massa, nada impede que um dos pares forme-se dentro do Horizonte de Acontecimentos, e o outro, fora. E se a antipartícula se formar dentro, e a partícula, fora, o que nós temos é um Buraco Negro um pouquinho mais magro, emitindo sinais de sua existência para as redondezas...
E se o Buraco Negro pode perder massa dessa forma, cedo ou tarde essa massa vai acabar, certo? E o que acontece quando acaba? Bem, se você puder responder essa pergunta e nos dar bons motivos para acreditar que sua resposta é confiável, o Nobel da Física é seu.

Onde tudo começou

Isso tudo o que falamos é uma visão muito, muito superficial da coisa toda. Buracos Negros não são os causadores de alguns dos debates mais acalorados entre físicos à toa... Tudo o que os envolve está repleto de incertezas, e demanda respostas complicadas que desafiam tudo o mais que sabemos sobre o Universo.

Ou sobre Os Universos. Sim, pois existem até teorias sobre a possibilidade dos Universos serem formados à partir de Buracos Negros. Uma pequena área no tempo-espaço concentrando uma quantidade de matéria infinitamente densa te faz lembrar o Big Bang?

Sabemos que somos feitos do pó das estrelas. Mas será que somos frutos, também, da singularidade dos Buracos Negros? Isso é algo que não podemos responder. Pelo menos por enquanto...

2 comentários:

  1. Gostei muito do texto, pois ele explica de uma forma muito fácil de entender, até para pessoas leigas sobre o assunto! parabéns!!!

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  2. Adorei o texto, muito mais fácil de entender para nós leigos mas amantes da astronomia, Parabéns!!!!

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