sábado, 17 de novembro de 2012

Como age um juiz ladrão?


O choro é livre – E recorrente.

Final de campeonato é sempre assim, uma única torcida sorri feliz da vida, muitas choram, e quase todas teorizam. Não existe na face da terra figura mais conspiracionista (existe essa palavra?) e chorona do que torcedor de futebol. Eu sei, porque frequento estádios, e estou cansado de ver (e participar de) xingamentos ao pobre coitado do árbitro que ainda nem apitou o começo do jogo e está apenas verificando se as redes estão bem fixadas.

Torcedor é isso mesmo, seu papel é apenas torcer, e o juiz sempre parece estar jogando no outro time. Mas como saber se de fato ele está?


O Santinho
Antes que digam que essa é uma postagem maldosa com os senhores do apito, eu também já ouvi, e muito, o mantra: “A arbitragem brasileira é ruim... Não acredito que fulano estava mal intencionado, ele apenas errou, e errou porque a arbitragem brasileira como um todo é fraca”. Bom, quanto a isso, precisamos pensar com calma: Será?

Por que necessariamente o arbitro não pode estar mal intencionado? Por que é sempre falta de competência? Caso algum de vocês se lembre, o espaço dos comentários fica aberto para que alguém cite ao menos um único setor, uma única profissão nessa nossa Terra de Vera Cruz que não esteja corrompida nem que apenas parcialmente. Políticos? Religiosos? Mídia? Segurança? Saúde? Educação? Desculpem, mas pelo menos por aqui, onde há interesse e dinheiro envolvido, há corrupção. Por que justamente no futebol, um dos meios mais sujos e repletos de interesses que existe no mundo (e negar isso é sintoma de hipocrisia ou inocência), o cara originalmente neutro que mais facilmente poderia interferir no resultado estaria acima de qualquer suspeita? Acreditar na completa inocência desses senhores é quase como pedir para um estranho tomar conta da sua bolsa enquanto você procura um banheiro na Praça da Sé ou Copacabana – Eu particularmente não recomendo.

Outro papo muito usado para tirar o bumbum desses senhores da reta é quanto a profissionalização. Dizem que assim que “profissionalizarem” a profissão de árbitro a coisa tende a melhorar. Bom, apesar de concordar que a classe precisa mesmo de uma revisão em sua condição como trabalhadores, devo também considerar que para ser árbitro, é preciso fazer curso, para apitar um jogo importante, é preciso ter experiência prévia e o principal, um arbitro da série A ou B do futebol (os mais cobrados, obviamente) costuma ganhar mais em um único jogo do que a esmagadora maioria dos trabalhadores brasileiros costuma ganhar em um mês. Se ainda assim não se pode considera-los “profissionais”, só posso lamentar e dizer que até onde se sabe, não tem-se por costume a prática de sequestrar homens de meia idade e joga-los dentro da Ilha do Retiro lotada, armados apenas de um apito. Ninguém obrigou o cara a escolher a profissão numero 1 dos filhos das famosas acompanhantes VIP.

Pode isso, Arnaldo?

Mas é claro que nem todos os árbitros entram em campo dispostos a interferir no resultado. Aliás, a grande maioria é apenas como eu e você, uma pessoa que ama o futebol acima de tudo e não está disposta a fraudar o resultado.

A maioria dos “roubos” não é nada mais do que, como eu disse no começo do texto, fruto da imaginação de torcedores paranoicos e chorões. Não importa se mesmo no replay aquele lance gera discussão, sempre aparece um engraçadinho pra postar um “dossiê” no Youtube em que esse lance aparece “provando” que time X está sendo protegido pela máfia dos resultados e o time dele, o Y, é totalmente inocente, o ultimo suspiro do “bem” que sobrou no esgoto chamado futebol brasileiro.

E não importa se o cara torce pro Flamengo, Corinthians, São Paulo, Palmeiras, Vasco, Botafogo, Santos, Cruzeiro, Fluminense, Atletico MG, Grêmio, Inter, Portuguesa, Coritiba, Atletico PR, Goiás, Bahia, Vitória, Figueirense, Criciúma, Náutico, esse time que você está esperando ler mas eu não citei ainda, enfim, não importa pra qual time o sujeito torce, a linha de raciocínio dele partirá sempre do principio de que só o seu time é honesto e os demais são sujos, e isso leva a crer que ou todos são honestos (será?) ou todos são sujos (eu apostaria nessa). E se todos são sujos, podemos presumir que, ainda que do jeito errado, as coisas se nivelam e não há porque sair se desesperando e procurando influencia da arbitragem no insucesso do seu time ou no titulo do rival. Todos erram.

O cone do centroavante do seu time perde gols incríveis debaixo da trave. O mão de alface do goleiro do seu time entrega a rapadura de vez em quando. O burro do treinador do seu time já está jogando o campeonato no lixo na quinta feira, quando o jogo é no domingo. E o árbitro, como todos os demais, também erra em lances capitais – e geralmente não é por maldade. E o arbitro está cada dia mais exposto pois cada dia há mais câmeras vigiando cada centímetro do campo. A arbitragem não está piorando, o jogo está ficando mais dificil, mais rápido, mais pegado, mais forte, e ao mesmo tempo, há mais tecnologia para vigiar o arbitro que pode contar apenas com seus 5 sentidos e um pouco de sorte.

“Espera aí, você falou tudo isso só pra dizer que não devemos desconfiar? Está me fazendo de idiota?”. Calma, jovem gafanhoto! O que estou dizendo é que no caso, o Diabo mora nos detalhes. Não é aquele pênalti gritante não marcado que derrubou seu time pra segunda divisão. E nem aquele foi aquele cartão vermelho injusto que selou o destino do seu time daquela Libertadores que pra você estava fácil... Depois de tanto enrolation, vamos lá: Como o árbitro interfere no resultado, afinal?

Foi ou não foi?

Caso você tenha TV por assinatura em casa e alguns canais de esporte, experimente dar uma rápida zapeada só para conferir comigo quantos jogos ou programas com velhinhos metidos a sabichões falando de futebol vamos encontrar. Se estiver lendo isso no horário de almoço ou numa noite de domingo, você pode fazer isso também na TV aberta e no rádio.

Se o tempo é relativo, a semana de um arbitro que errou em um lance capital de um jogo importante passa tão rápido quanto uma lesma fêmea comprando sapatos novos no shopping. E pode haver mais em jogo do que simples torração de saco na TV e internet. O cara não consegue nem andar na rua em paz enquanto as pessoas não esquecerem um pouco o episódio (por sorte, o prazo de validade das lembranças futebolísticas das pessoas comuns costuma durar apenas de quarta a domingo e vice versa). Não é nos lances capitais que se muda o resultado da partida. É nos lances que ninguém vai nem se dar ao trabalho de postar no Youtube.

Assopra o tio mal intencionado e começa o jogo. Logo no começo do jogo, ele marca uma falta contra o time que pretende prejudicar, no meio de campo, num lance totalmente interpretativo. Minutos depois, acontece um lance muito parecido, mas o jogador que é derrubado é do time que o arbitro quer que perca. Ele “não vê”. Teoricamente não há grande influencia no resultado em duas faltas que não dariam em nada, mas a idéia é irritar. Lances assim acontecerão durante todo o jogo, o que é falta pra um lado, pra outro pode não ser. O jogador repara isso, as vezes até imagina sem que isso exista. Mas quando isso entra na cabeça do jogador, começa a enervar. Muita gente, diria a maioria, perde rendimento quando perde a cabeça, além do que, quem perde a cabeça faz mais faltas. Se faz mais faltas o juiz apita mais, contra. E quanto mais ele apita, mais o fulano se irrita. E assim vai minando a cabeça do time.

Mas não é só isso. Uma chegada um pouco mais forte, antes dos 10 ou 15 minutos talvez, e é cartão amarelo pro zagueiro do time que está jogando “contra o arbitro”. Na TV, o comentarista pode até dizer que o arbitro está tentando “controlar o jogo desde cedo” e dar razão. No campo, temos um zagueiro que não pode mais dar combate como antes sob o risco de ser expulso. Aliás, agora restam 80 minutos pro arbitro expulsar o jogador com o segundo cartão amarelo, sem precisar ser tão polemico quanto seria em uma expulsão direta.

Há também os laterais, impedimentos e afins. Pra isso existem os assistentes, mas nem sempre eles ajudam. Aliás, muita gente não repara, mas é comum o assistente esperar o arbitro apitar ou pior, esperar ouvir o tradicional “É nossa!” de um dos jogadores para então apontar de quem é a posse de bola – compreensivelmente, afinal, apesar deles estarem ali praticamente só pra isso, do lado de fora do campo nem sempre é fácil ver se a bola resvalou ou não em alguém. Basta ao arbitro mal intencionado inverter todos os laterais duvidosos a favor do time que ele pretende ajudar. É como no caso das pequenas faltas em lugares “mornos” do campo: Quase ninguém desconfia de laterais, mas quem está jogando percebe. E se irrita.
E outras técnicas. Apesar de que o microfone que permite a comunicação entre os árbitros e as mil câmeras coladas na cara dele ávidas por serem usadas pelos especialistas em leitura labial depois tenham inibido um pouco essa pratica, o arbitro sempre teve a possibilidade de abusar da autoridade, ironizar, xingar, ofender, gesticular e ofender os jogadores, bastando ser minimamente sutil para não dar tão na caruda. E se quem exclama o “É nossa!” no lateral não é o jogador do outro time, e sim o arbitro, com um sorrisinho no canto da boca? E se você vai reclamar com ele e, além de te ironizar e te xingar ainda mais do que você sequer pensou em xingá-lo, ele te dá um cartão amarelo como forma de te calar?

E assim vai, os 90 minutos. O futebol é jogado por humanos, e humanos perdem a cabeça. Daí pra perderem o jogo, é um passo. Um zagueiro nervoso está a um passo de cometer um pênalti ou ser expulso. Um atacante nervoso vê o gol ficar pequeno e a bola ficar leve como uma bexiga na hora de chutar. E no outro dia, são esses que a imprensa vai usar como os verdadeiros vilões e tirar a responsabilidade do árbitro.

É lógico, mesmo o arbitro mais mal intencionado do mundo não consegue ser mais decisivo do que os verdadeiros heróis do futebol, os craques. E se a tecnologia está jogando contra os arbitros "do bem" até aqui, talvez seja a hora de usar a tecnologia contra os arbitros "do mal". Mas enquanto os velhinhos da Fifa não se resolvem, não custa abrir os olhos, meus amigos. Não é pelo leite derramado que vocês devem procurar. Ao invés disso, procure pelo buraco na caixinha. 

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