A postagem sobre O Mundo de Beakman pode ter te lembrado de
quando você sonhava ser um cientista quando crescesse. Mesmo que você não
soubesse muito bem o que faz um cientista, e seus grandes exemplos de
cientistas fossem, além do Beakman, o Tíbio e o Perônio, é possível que em
algum momento da sua vida você tenha se apaixonado pelo maravilhoso mundo da
ciência.
Pois curiosidade todos tem. As pessoas precisam apenas de
incentivo para exercitá-la. O problema é: E quando o incentivo vem da maneira
errada? E quando a “ciência” que desperta a sua curiosidade não é tão
cientifica assim?
O
método certo
A ciência não tem todas as respostas certas. Aliás, pode-se
considerar que o máximo que a ciência tem são respostas provavelmente certas. A ciência não dá certeza de nada e o seu
principio é a duvida, e até então, qualquer um de nós pode contestar qualquer
teoria científica, desde que tenhamos como convencer alguém de que estamos
certos e o mundo todo está errado. Não acredita na força da gravidade e acha
que na verdade somos puxados para baixo por elásticos invisíveis interagindo
conosco através de uma fenda interdimensional? Boa sorte em tentar provar isso
– é o que diz a ciência.
Isso evita que cientistas visionários com ideias muito a
frente do seu tempo sejam jogados em hospícios e fogueiras (o mundo não quer
ver novos Copérnicos sendo reconhecidos apenas depois da sua morte). Mas como se
prova as coisas? Provar algo passa longe
de interpretar profecias com base em coincidências vagas, gritar argumentos como
se fossem uma verdade absoluta ou escolher a dedo quais informações apresentar
e quais ocultar. Ciência se prova com o
método científico.
Muitas pessoas
relacionam “método científico” com “algo que inventaram pros professores
descontarem pontos dos meus trabalhos na faculdade”, mas ele é muito mais do
que isso (e seus professores estão certos em te fazer automatizar o método como
forma de trabalho nem que seja na marra),
mas ele vai muito além disso. Ele serve para testarmos o quanto alguma
afirmativa é fiável. Eu poderia escrever detalhadamente sobre como funciona o
método científico mas acho melhor você clicar na Wikipédia ou nesse blog, ou
nesse, ou nesse se quiser saber com mais detalhes. Para agilizar essa postagem
(que não é especificamente sobre método científico) vou dar um exemplo de
método científico extremamente simplificado:
Se possível, gostaria que você pegasse uma caneta, ou o que
você pelo menos acredita que é uma caneta. O que você tem em mãos é um objeto
cilíndrico, possivelmente de plástico, com uma ponta esferográfica, e um tubo
cheio de tinta dentro (não sou bom com descrições, e a sua caneta pode ser um
pouco diferente, mas é mais ou menos isso, certo?). Ela se parece com uma
caneta? Sim. Nesse caso, se ela realmente for uma caneta, espera-se que ela
seja capaz de escrever numa folha de papel. Façamos um teste. Ela escreveu?
Sim. Se ela se parece com uma caneta e cumpre o esperado que uma caneta faça,
você pode deduzir, com uma boa chance de acertar, de que é uma caneta. Mesmo
que ela tenha falhado no teste, você poderia pensar em um jeito de testar se
não se trata de uma caneta quebrada. Ou se duvida da conclusão que chegamos,
você pode testar se a caneta não é uma das armas do James Bond.
Isso é o esqueleto do método científico: Há um fato
(há um objeto cilíndrico em minha mesa),
Surge uma dúvida (o que é isso?),
faz-se observações sobre o fato (parece-se
com uma caneta), formula-se uma hipótese sobre o comportamento que devemos
esperar se as nossas suspeitas estiverem certas (se for uma caneta, será capaz de escrever) e por fim, testamos de
alguma forma se nossas suposições estão certas ou não (escreveu, deve mesmo ser uma caneta!).
Tudo bem, quando falamos de coisas como uma caneta, talvez o
método científico não seja de grande ajuda. Afinal, a menos que você seja a
pessoa mais cética do mundo, as lembranças de outras canetas que você já viu, o
vendedor da papelaria e as palavras “Caneta Esferográfica” no rótulo da caixa
devem ser evidencias suficientes para te convencer de que o que você está vendo
é uma caneta. Mas e se o problema for um pouco maior? O Universo é infinito?
Ele sempre foi desse tamanho? Ele sempre foi como é hoje? Quando ele surgiu? Como
ele surgiu? Se houve um criador, o mesmo não parece ter se preocupado muito em
nos deixar um manual de instruções ou o telefone de um SAC para tirarmos nossas
dúvidas. O jeito é investigar, e o método científico é a melhor forma.
Distração perigosa
O método científico não trabalha com certezas, e sim, com
probabilidades. Mas algumas pessoas tem certeza daquilo que acreditam. E quando
o método científico vai contra o que essas pessoas acreditam, nasce a
pseudociência.
De forma bem simplificada, a pseudociência é tudo aquilo que
se define como cientifico sem de fato ser. Ou, no mínimo, sem respeitar o
método científico, chegando até mesmo a ignorar resultados contrários obtidos
através do mesmo.
A pseudociência, no entanto, é quase tão popular quanto à
ciência propriamente dita, pois ela mexe com outro ponto que anda lado a lado
com a curiosidade: O apego ao fantástico.
As pessoas gostam de acreditar que suas vidas são
diretamente guiadas e sua personalidade reflete o alinhamento de estrelas em
constelações milhares de anos luz daqui. Gostam de acreditar que é possível
prever o futuro jogando cartas e acham legal a ideia de ter um monstro no fundo
do Lago Ness – e realmente, em nível de entretenimento, essas coisas são
divertidas (algumas, como a criptozoologia, até são tratadas aqui no blog vez
ou outra, pois é inegável que são assuntos divertidos). A questão é até que
ponto podemos acreditar nelas.
Defensores da pseudociência geralmente se apresentam como
legítimos cientistas e defendem suas teses de forma convicta. Apresentam
diversas evidencias e, o principal, não dão margem para questionamentos, nem
confrontam seus dados com alguma explicação alternativa – e quando o fazem,
apresentam uma visão superficial da outra explicação, de forma que ela pareça
inválida (um exemplo clássico, já bastante tratado aqui, são as pessoas que
“explicam” a teoria da evolução de forma a fazê-la parecer sem sentido em prol
das suas crenças). O problema, no entanto, é que normalmente esses caras são
BONS nisso, e acabam convencendo muita gente que estão falando a verdade, por
mais que estejam falando coisas que não façam sentido (veja quanta gente não
acredita que Neil Armstrong foi à Lua, por exemplo – duvidando de algo que nem
a URSS contestou).
Um exemplo muito famoso de pseudociência se reflete aos
Deuses Astronautas. Embalada pelo livro de um jornalista que por sinal vendeu
muito bem, ficou famosa a ideia de que os deuses de diferentes religiões
(incluindo os deuses Gregos, Maias, Jesus Cristo e possivelmente todos os
outros) na verdade fossem Extraterrestres que interagiram com nossos
antepassados muito tempo atrás. Numa época remota em que viagens galácticas nem
passavam pela cabeça das pessoas, seres portando uma tecnologia muito além da
nossa, que desciam do céu em suas imponentes carruagens de metal movidas pelo
fogo podiam facilmente ser confundidos com Deuses. A ideia até faz sentido e o
livro não deixa de ser interessante (eu já o li, e realmente é uma leitura
agradável).
Mas isso não quer dizer que seja uma explicação muito
confiável, por um motivo bem simples: Existem muitas outras explicações menos
improváveis. Vamos pegar o exemplo de Jesus: Mesmo que você não acredite que
ele é o filho de Deus, ainda podemos assumir diversas explicações pra ele ter se
tornado um personagem tão importante e influente na história, entre as quais,
podemos considera-lo o maior psicólogo e o maior mestre no marketing pessoal da
história, podemos vê-lo como um líder dotado de um carisma único, alguma
espécie de gênio da medicina e outras práticas com um discurso libertador que o
povo ansiava ouvir, ou simplesmente um cara cujo a história de vida foi ficando
mais incrível gradualmente no maior telefone sem fio de todos os tempos – E isso
até exclui a necessidade dele ter existido. Todas essas explicações são muito
mais simples e fáceis de acreditar do que ele ser alguma espécie de hibrido
entre ETs e humanos. E uma coisa básica que sabemos é que, normalmente, quanto
mais improvável for uma solução, menor a chance dela ser real. Pseudo
Cientistas, no entanto, não se importam de ir pelo lado contrário para defender
o que acreditam – e as vezes nem se importam com isso.
A pseudociência, por si só, não é um grande problema: Cada
um gasta seu tempo e sua curiosidade como quiser. O problema é que as vezes ela
pode ser usada de forma, digamos, irresponsável. Desde vigaristas que enriquecem
às custas da inocência alheia a suicídios coletivos para fugir de um fim do
mundo que nunca aconteceu, a pseudociência acaba interferindo em nossas vidas
de maneiras como você nem pode imaginar. O que você pensaria se soubesse que
aquele político que você ajudou a colocar em Brasília está consultando os
astros nesse momento, procurando ajuda antes de tomar uma decisão que vai
interferir na vida de milhões de brasileiros? Acontece com uma frequência assustadora.
A linha
É dificílimo separar o que é pseudociência e o que não é.
Elas muitas vezes andam próximas e uma por vezes desagua na outra. Embora defendida
e praticada por muitos nomes incontestáveis no meio científico, como Carl
Seagan (o cara da série “Cosmos”) por exemplo, muitos cientistas consideram a
exobiologia (a busca da existência de vida fora da Terra, não confundir com a
Ufologia, que é a busca por discos voadores e alienígenas aqui na Terra mesmo, pois
essa é uma pseudociência típica) como uma pseudociência também, por diversos
fatores. Falando em espaço, a astrologia, hoje considerado uma pseudociência,
deu origem à astronomia, um dos ramos científicos mais respeitados (e por muito
tempo alvo dos maiores investimentos de algumas nações). E se hoje sabemos da existência
do Celacanto, um gênero de peixes que parecia estar extinto à milhões de anos,
os criptozoólogos merecem o crédito. Tudo bem que para cada caso como o do
Celacanto, existe uma dezena de Pé Grandes ou Monstros do Lago Ness que jamais
foram (e provavelmente jamais serão) provados. Mas se um dia encontrarem uma
preguiça gigante viva andando pela Amazônia, teremos mais um homem que acordou sendo
um criptozoólogo maluco e ao final do dia foi dormir como um cientista
respeitado. E seria muito legal.
Mesmo que a Terra não seja oca. Mesmo que jamais tenhamos
que nos preocupar com invasões alienígenas, mesmo que o mundo não acabe em 2012
(espero que não, já tenho planos pro ano que vem), mesmo que não exista mais
nenhum dinossauro escocês aquático e Sodoma e Gomorra não tenham sido atingidas
por um ataque nuclear, esse tipo de assunto atiça nossa curiosidade e é
divertido. O importante é saber que existe muita coisa tão interessante quanto
e muito mais palpável que podemos realmente estudar e entender - que a ciência,
pura, sem firulas, nos guarda muita coisa incrível, tão incrível quanto aquilo
que talvez não exista. O maior mistério do nosso Universo é ele mesmo. E dele,
sabemos muito pouco...
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