“Raiou a era da exploração no mundo de Arcadia. Bravos aventureiros partiram pelos céus em busca de incontáveis tesouros.
E, onde houverem tesouros, haverão Piratas do Ar... “
O que faz um bom jogo de videogame? Bem, basicamente, jogar videogame consiste naquilo que você vê, e naquilo que você ouve. E as diferentes formas de interagir com esses elementos são o diferencial de videogames para filmes.
Então, espera-se que um grande jogo de videogame seja aquele em que a experiência visual e sonora casem perfeitamente com as possibilidades de interação que o jogador tem. Ótimo.
E como se conta uma boa história? É um pouco mais complexo, mas em geral, uma boa história é aquela que cativa e mantém a pessoa entretida, faz com que ela se identifique e queira sempre saber o que vai acontecer a seguir.
E quando um bom videogame se casa com uma boa história? Com o passar dos anos, virou moda, nos videogames, terem enredos complexos, repletos de reviravoltas e personagens marcantes. Muitas séries se consagraram e ficaram famosas, até mesmo longe do universo dos videogames, apostando nessa receita. Mas foi de uma história aparentemente inocente e simples, sem todo a badalação de séries consagradas, e apostando numa mecânica das antigas que surgiu uma das maiores obras primas da histódia dos videogames: Skies of Arcadia.
Piratas do bem
Skies of Arcadia é um jogo de RPG (Role Playing Game, onde você assume o papel de um personagem e segue uma trama) lançado no começo da década passada. Ele conta a história de Vyse, um menino cujo o pai é o capitão de um grupo de piratas, chamados Blue Rogues (“Vampiros Azuis”, numa tradução literal). O sonho de Vyse é ser um capitão tão respeitável quanto o seu pai, e de preferência do seu próprio navio, porém, por hora, tudo o que ele consegue é ser mais um dos buchas de canhão da tripulação (é, ele não tem moleza só por ser o filho do chefe). Os Blue Rogues, embora piratas, não são tão malvados assim. Seus ataques costumam ser contra navios do Império de Valua, que não são exatamente o império mais legal e justo do mundo, fazendo os roubos dos Blue Rogues justificáveis pela política do Robbin Hood...
A vida de Vyse seguia nessa rotina, até o dia que ele cruza o caminho de Fina, a menina misteriosa da vez. Qual o mistério por trás de Fina? Bem, ela não se lembra, mas o fato é que onde quer que ela vá, a Armada Imperial de Valua vai atrás dela, então ela deve ter algum segredo muito importante guardado.
A verdade é que isso serve de pano de fundo para que Vyse, Fina e Aika (uma amiga de Vyse, que mora no mesmo vilarejo que ele e também é uma pirata) participem de grandes aventuras e conheçam muitos outros personagens (muitos mesmo).
A história pode não ser das mais criativas. Aliás, se resumirmos ao máximo, ela consiste em um jovem sonhador com sua melhor amiga, protegendo uma gatinha misteriosa e procurando por cristais mágicos. E isso é algo muito RPG das antigas. O grande barato da coisa não é o que a história do jogo diz, e sim, como ela diz...
Quem disse que ser das antigas é ruim?
Skies of Arcadia foi lançado já com o estigma de jogo das antigas. Na verdade, a idéia era exatamente essa: Fazer um RPG que remetesse aos clássicos. Porém, isso foi feito com maestria: Há uma história simples, como as antigas, e a jogabilidade também não é cheia de firulas. Tudo isso é equilibrado de tal forma, que o resultado não pode ser definido por nada menos que “perfeito”.
Para começar, os gráficos: Se não são os melhores de nenhum dos consoles em que foi lançado (Dreamcast e Gamecube), não chegam a ser feios. Porém, a direção de arte do jogo compensa isso: A sensação de liberdade e as lindas paisagens que você vai passar compensam as pequenas falhas gráficas. Aliás, sensação de liberdade? Reparou que nesse jogo, todos os barcos voam? Sim. Todo o mundo do jogo se situa em ilhas e continentes que ficam suspensas no ar, flutuando! E portanto, você “navega” pelos “oceanos” do céu. Coisa de doido, mas espere até ter nas mãos um barquinho desses: A sensação de controla-lo pelos céus é sensacional. Se fosse um game só disso, não faria feio.
No comando de Vyse ou os outros personagens jogáveis, o jogo apresenta duas partes distintas, bem conhecidas dos jogadores de RPG de videogame: Em uma você explora as cidades, barcos e outros lugares seguros, batendo um papo com as pessoas, comprando itens, resolvendo alguns enigmas, fazendo amigos, jogando alguns mini-games ou vendo algumas cenas ocasionalmente. Resumindo, é onde a história progride. E na outra, você explora calabouços, galerias e cavernas a pé, ou mesmo os céus a bordo do navio, lutando contra monstros e enfrentando os chefes.
As lutas acontecem no sistema de turnos, de maneira bem simples, mas eficiente e divertida. As vezes é um pouco chato que as batalhas aleatórias aconteçam em uma frequência altíssima, mas mesmo assim o sistema de batalhas cumpre perfeitamente seu papel.
Mas o maior destaque mesmo fica para o desenrolar da trama
Evoluindo nas nuvens
A trajetória de Vyse, de mero aspirante até a liderança de sua própria tripulação será longa e árdua, e o Império não vai facilitar em nada. Mas a maneira como o jogo conta essa história é simplesmente incrível. Cada situação, cada personagem, é apresentado de forma genial. Desde os inimigos até os amigos, dos piratas rivais (Black Pirates) até os altos comandantes do Império de Valua, desde personagens centrais da trama até alguns que só compõem o elenco, todos são, cada um a sua maneira, marcantes e únicos.
O jogo oferece uma quantidade de recursos e uma liberdade de personalização incrível, desde as partes do seu navio até a tripulação. Que tal ter sua própria ilha – esconderijo? Legal né? Pois é. Porém, essas opções vão se mostrando com o tempo. No começo, a estrutura do jogo é bem simples. A maneira como ela vai evoluindo, junto com os personagens e a trama num geral é feita numa sincronia perfeita.
O desenrolar da trama também é espetacular. Chega a ser difícil parar de jogar: Você sempre fica ansioso para saber o que vai acontecer a seguir. Para fechar, temos uma qualidade sonora de primeira: Músicas orquestradas que casam perfeitamente com a situação, dando o clima perfeito, independente do que você esteja fazendo, seja lutando, pilotando um barco, ou fazendo ambas ao mesmo tempo (durante uma das espetaculares batalhas entre barcos).
É confortante notar que a história, no geral, chega a lembrar uma animação japonesa daquelas bem humoradas, embora repletas de ação (como Yuyu Hakusho ou Dragon Ball). Não tem personagens andrógenos com conflitos de personalidade, tentando descobrir quem eles realmente são, como está na moda nos RPG's japoneses atuais. O fato é que jogar um RPG mais recente em um dia ruim pode ser o ingrediente que faltava para motivar um suicídio, de tão dramáticos que eles vem ficando. Skies of Arcadia não é assim, e com ele as risadas são garantidas. Ainda bem.
Uma obra prima desconhecida.
Skies of Arcadia, por uma série de motivos, nunca atingiu o estrelato. Não é um RPG badalado, como Final Fantasy ou Chrono Trigger. Porém, não faz feio diante desses jogos. Aliás, para boa parte das pessoas que jogaram Skies of Arcadia, ele é muito melhor do que qualquer jogo do gênero já feito. Um prato cheio para quem curte boas histórias, personagens marcantes e um pouco de nostalgia.
Numa época em que RPG's estão muito mais interessados em parecerem filmes, e contar histórias tão elaboradas com mundos tão complexos que no final ninguém entende nada, pode vir a calhar um game que faz da simplicidade sua principal aliada, e diz para qualquer RPG da nova geração: “Aprende. É assim que se faz para contar uma história marcante!”
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