Hoje em dia, realizar a Copa do Mundo de futebol demanda trabalho. O Brasileiro está vendo (embora a maioria finja que não) o quanto essas obras, faraônicas por sinal, movimentam de dinheiro, recursos e tempo, para ficarem prontas afim de sediar alguns poucos jogos no verão de 2014, tudo sobre a desculpa (certamente mentirosa) de trazer estrutura e desenvolvimento junto com elas, além de receber de volta o dinheiro investido graças a vinda massiva de turistas (outra falácia que de tanto ser repetida, se tornou verdade).
A verdade é que, como o povo gosta mesmo é de pão e circo, tudo isso será justificado por um mês de festa na nossa pátria amada. E a verdade é que a Copa do Mundo, antes um mero torneio que alguns países até se recusavam a participar, cresceu demais e se tornou um dos principais eventos do planeta em todos os âmbitos. Cresceu e mudou tanto, que voltar no tempo, exatos 64 anos antes da próxima Copa do Mundo, ao ano de 1950, e ver como foi a última Copa realizada por aqui, pode ser surpreendente para os desavisados, embora algumas coisas (o tal jeitinho brasileiro) sejam comuns em ambas. E para que você deixe de ser um desavisado, é exatamente isso que faremos agora: Vamos voltar ao tempo de ouro do paletó e do chapéu, do pós guerra, e examinar a Copa mais trágica (no sentido esportivo) e mais marcante (por termos organizado) da história do Brasil.
A volta da Copa do Mundo
A Copa do Mundo de Futebol começou a ser disputada em 1930, no Uruguai. Na época, poucas seleções se interessaram, primeiro por ser um torneio pioneiro, segundo, por ter sido disputado “na selva” (se hoje em dia o Europeu pensa que a América do Sul é uma zona, imagine naquela época...). Nas Copas de 1934 e 1938 o interesse de todos (países e torcedores) foi gradativamente aumentando. Porém, na década de 40, devido a um “pequeno” detalhe (uma tal de II Guerra Mundial), não houve a menor condição de disputarem o evento (o que foi um baita azar da Argentina, que com jogadores do calibre de Di Steffano e Sastre, estava anos luz de qualquer adversário na época).
Em 1950, com a poeira do conflito já mais baixa, a Copa finalmente pôde voltar. O grande problema era: Onde? Os países da Europa estavam em ruínas. Aliás, o mundo, quase todo, achava mais importante que o dinheiro virasse remédios, roupas, alimentos e abrigos do que estádios. Só um lugar pensava diferente, o Brasil (qualquer semelhança com os dias atuais não é mera coincidência).
Preparados?
Uma vez decidida onde seria a Copa, era hora de se preparar. Sim, o Brasil precisava modernizar-se para receber a Copa do Mundo. Felizmente, naquela época não tivemos elefantes brancos construídos em estádos onde praticamente não há futebol profissional. Aliás, o único estádio realmente construído para a Copa foi o Maracanã. Não que, para a época, o estádio carioca tenha saído barato: Construído para ser o maior estádio do mundo (e foi durante um bom tempo), o Maracanã saiu caro para os cofres públicos e recebeu duras críticas de boa parte da imprensa da época.
Aliás, se você acha que atrasos nas obras são coisas atuais, pense de novo: O número de pessoas trabalhando na obra teve que aumentar substancialmente nos meses finais para permitir que o estádio ficasse pronto para a Copa. Não ficou. Mesmo assim, ainda que parcialmente inacabado, acabou sendo palco de todos os jogos que estavam previstos, incluindo a fatídica e lendária final. Além do estádio do Rio de Janeiro, a Copa também teve jogos em São Paulo (Pacaembu), Curitiba (Vila Capanema), Porto Alegre (Estádio dos Eucaliptos), Recife (Ilha do Retiro) e Belo Horizonte (Independência). Como pode notar, nada de super-obras feitas especialmente para os jogos em lugares incompreensíveis... Também não houveram muitos investimentos (aliás, quase nenhum) em transporte, segurança e coisas do tipo, além dos normais para eventos grandes na época. Não haviam exigências nesse quesito, e mesmo que houvessem, dada a situação da Europa naquela época, qualquer coisa pareceria incrivelmente organizada e segura...
Quem veio para a festa?
Boa parte dos países do mundo não estavam interessados em participar. Mesmo a detentora do título, a Itália, relutou em vir. Aliás, dizem que ela só veio porque a Fifa bancou sua viagem... Haviam ainda alguns países, como a Alemanha, que não tinham permissão de participar, e outros que não tinham condição mesmo. Houve até o bizarro caso da Índia, que não disputou a Copa por que as regras da Fifa não permitiam que jogassem descalços! Outra desistência incomum foi a da Escócia: Após perderem para a Inglaterra nas eliminatórias, julgaram desnecessário medir forças novamente numa Copa do Mundo... Sendo assim, da 16 seleções que eram esperadas, apenas 13 apareceram.
As Européias, diga-se de passagem, exaustas. Afinal, algumas viajaram de navio (!) até aqui, o que convenhamos, não é uma viagem rápida e muito menos fácil. Aliás, a própria seleção Italiana, por exemplo, alegou que seus jogadores chegaram em média 5kg mais pesados que quando saíram, uma vez que o convés de um navio não é exatamente um bom lugar para treinar...
Falando em Ingleses, era a primeira vez que estes, os inventores do futebol, se sujeitaram a participar de uma Copa do Mundo. Anteriormente, haviam se negado, alegando que seu futebol era muito superior ao do resto do mundo e não havia necessidade de comprovar essa superioridade. A Brasil, Itália e Inglaterra, juntaram-se Bolívia, Estados Unidos, Paraguai, Uruguai, Suécia, Chile, Espanha, México, Suiça e Iugoslávia.
A Zebra também veio, a galope.
Aliás, veio praticamente um rebanho de Zebras (se é que o coletivo de Zebra seja rebanho mesmo...). O Brasil, por exemplo, teve a Copa na mão e a perdeu duas vezes seguidas, para o mesmo Uruguai. Sim, porque além da final perdida em casa, o Brasil podia ter sido campeão por antecipação caso o Uruguai empatasse o jogo anterior, contra a Suécia. O gol da vitória uruguaio aconteceu aos 85 minutos de jogo, feito pelo mesmo Ghiggia.
Mas há quem diga que o Maracanazzo passou longe de ser a maior zebra da Copa. O grande vexame mesmo foi dado justamente pelos Ingleses, que desembarcaram cheios de arrogância. Numa partida histórica contra um time amador montado as pressas pelos EUA, acabaram derrotados por 1 x 0, na possível maior zebra da história do futebol.
Entre outras histórias curiosas da Copa, destaca-se ainda o fato da camisa do Cruzeiro de Porto Alegre ter sido usado em uma das partidas. Ocorreu que no jogo entre México e Suíça, ambos os times tinham uniformes praticamente idênticos, e os organizadores precisaram recorrer ao jeitinho brasileiro. Destaque negativo fica para um triste ocorrido com a seleção Italiana: A seleção que veio para o Brasil estava longe de ser a ideal, já que a base da Azurra era o time do Torino, que havia morrido num acidente de avião pouco tempo antes.
A Copa teve tantos ocorridos esquisitos, que houve até jogador batendo a cabeça numa viga antes de começar o jogo, e se atrasando para a partida por estar fazendo curativos. Foi o caso do Iugoslavo Rajko Mitic, na partida contra o Brasil. Mítico mesmo foi seu atraso, já que o jogo começou sem ele, e com um a mais em campo, o Brasil abriu o placar com facilidade...
E o futebol?
Foi muito bem, obrigado. A fórmula de disputa, que terminava com um quadrangular ao invés de uma única final, propiciou muita emoção. O Brasil fez suas maiores goleadas em Copas do Mundo nessa Copa, 7 x 1 na Suécia e 6 x 1 na Espanha. Aliás, a seleção brasileira ficou marcada pela derrota, mas fez uma Copa do Mundo brilhante. O Uruguai também deu show, com uma goleada por 8 x 0 sobre a Bolívia, aliás. Decepção ficou para a Inglaterra, favorita, eliminada na primeira fase. Idem aos Ingleses estavam os Italianos, atuais campeões, também eliminados na primeira fase.
Com média de público de quase 48 mil pessoas e uma final disputada para cerca de 178 mil (e não 200 mil como diz a lenda), a Copa foi um sucesso.
Mas o símbolo dessa copa, mesmo, é o Maracanazzo. A “final”, em que o Uruguai venceu o Brasil por 2 x 1, de virada, sendo que os brasileiros precisavam apenas de um empate. O choque da derrota brasileira foi tão grande que por pouco os organizadores não esqueceram de entregar a taça aos Uruguaios (acredite, só lembraram quando os jogadores do Uruguai perguntaram onde ela estava...)! A derrota foi tão dolorida que o uniforme branco da seleção Brasileira foi abandonado depois desse jogo, acusado de trazer má sorte.
Um segundo Maracanazzo parece ser o maior medo da maioria da população para a próxima Copa. Superando, aliás, por uma larga margem, uma eventual preocupação com o desvio de verbas, os milhões de reais investidos em elefantes brancos, os atrasos providencias nas obras para obrigá-las a serem terminadas as pressas e sem fiscalização, o dinheiro investido que NÃO vai voltar de forma alguma para o Brasil ou tudo o mais que nossos políticos estão aproveitando para fazer sob esse pano de fundo. Uma pena. O tempo passa, e 64 anos são suficientes para mudar muita coisa. Mas a política do pão e do circo parece ser eternamente infalível...
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