De tempos em tempos aparece na mídia a notícia de que foi encontrado um fóssil, datado de trocentos milhões de anos atrás, que pode ser o elo perdido entre uma espécie extinta e uma atual.
Tudo muito lindo, muito interessante, mas várias dúvidas frequentemente aparecem quando falamos de fósseis, como por exemplo, a clássica: Como eles sabem a idade do fóssil?
Afinal de contas, não é como se ao lado do que restou do animal estivesse algum registro do tipo “falecido 200 milhões de anos atrás”, ou qualquer coisa aparentemente identificável a primeira vista. E isso é um prato cheio para os negadores da ciência. E acredite, quando se trata de quaisquer assunto relacionado a teoria da Evolução, a quantidade de negadores é muito grande.
Mas datar um fóssil não é um segredo, algo místico ou totalmente incompreensível. É até bem simples. E nós vamos ver como eles fazem isso agora, enquanto entendemos um pouquinho melhor o que são e como se formam os fósseis, e, já que o assunto são animais extintos, vamos esclarecer porque não encontramos os famosos “elos perdidos”...
O que é um fóssil?
Antes de falarmos como eles datam os fósseis, precisamos entender, de fato, o que é considerado um fóssil.
Um fóssil, teoricamente, é um registro de atividade biológica preservado em um sistema natural. Traduzindo: É alguma marca deixada na natureza por qualquer coisa que algum dia foi viva.
E isso compreende muita coisa. Pode ser, por exemplo, um mamute congelado no gelo, as pegadas de um dinossauro ou a impressão de uma folha de uma planta. Ou, para dar um exemplo famoso, um mosquito pré-histórico preservado no âmbar (no melhor estilo Jurassic Park).
Hoje em dia temos um registro fóssil relativamente amplo, com muitas variações de tipos de fósseis, de todo o tipo de espécies imagináveis. Alguns, obviamente, muito mais bem preservados do que outros. Mas como eles se preservam?
Como a mágica acontece?
Então, o dinossauro (e vou usar o dinossauro na maioria dos exemplos, porque eles são os fósseis mais populares e também são exemplos divertidos de usar) estava caminhando pela floresta. De repente sentiu uma dor no peito. Andou mais um pouco e caiu. Bateu as botas, ou melhor, as patas. Alguns milhões de anos, no entanto, alguém estaria andando na mesma floresta (que já havia se tornado um deserto), e tropeçou nos ossos do infeliz dinossauro. Simples assim.
Pena que, infelizmente, não é assim que funciona. Fósseis não se formam tão facilmente quanto no exemplo acima. Tem que acontecer um processo um pouco mais elaborado, mas que não chega a ser tão raro quanto normalmente é citado. Aliás, podem acontecer vários processos.
Um deles, e o mais famoso, por conta justamente dos dinossauros (cujo a maioria foi encontrado nesse tipo de fósseis), diz respeito a mineralização, que nada mais é do que a substituição dos restos orgânicos por matéria mineral, como rocha, por exemplo, que acaba formando um molde dos restos do animal.
Para exemplificar de uma forma extremamente simples, suponhamos que o dinossauro do exemplo acima morreu e logo foi coberto por sedimentos, vamos supor, a lama de uma inundação repentina que o lugar sofreu. Depois de um tempo (muito tempo), os sedimentos vão se solidificando, mas preservam a estrutura básica das partes mais resistentes do animal que estão cobrindo. O que sobre é uma rocha com a forma do esqueleto do dinossauro em questão gravada nela.
Podem haver outras maneiras ainda de preservar os restos animais, que, se não duram potencialmente toda uma eternidade como essa, podem ser muito melhores para conservar estruturas orgânicas mais propriamente, como pêlo, por exemplo. Uma dessas outras maneiras é, como já foi dito, que o animal seja congelado de alguma maneira. Ou ainda que ele seja mumificado, seja preservado no âmbar (que é uma espécie de líquido secretado por algumas árvores, que pode se tornar sólido e durar milhões de anos), etc, etc, etc...
Vale citar que, principalmente depois do descobrimento do Celacanto (um peixe pré-histórico que pensavam estar extinto) ainda vivo, o termo “Fóssil Vivo” se tornou bem comum. No entanto, como você pode perceber, isso é apenas uma metáfora.
E como eles sabem a idade do fóssil, afinal?
É mais simples do que parece. Veja: Para cada medida de tempo que você precisa, você usa um relógio diferente. Para saber as horas e os minutos você usa um relógio. Para saber os dias do ano, você usa um calendário. Assim é mais fácil termos uma medida precisa do tempo que precisamos.
Na natureza também é mais ou menos assim. Existem certos “relógios” que podemos usar para medir certas medidas de tempo, com uma precisão surpreendente. E são eles que nos ajudam a datar os fósseis. Para cada tipo de material, temos uma medida diferente e relativamente precisa.
Por exemplo, podemos usar uma medida química, com base no tempo em que os elementos presentes em um corpo perdem suas propriedades e se tornam outro elemento, vamos dizer assim, para não complicar o texto e não ficarmos debatendo a tabela periódica. Esses elementos químicos tem um tempo esperado para perderem suas propriedades e se tornarem outro elemento. Então, o que os cientistas fazem é contar o tempo que leva para metade do processo acontecer, ou seja, metade do material disponível se tornar outro material.
Com esse exemplo isso ficará mais claro: Vamos imaginar que à cada 5000 anos, metade da composição do elemento X converta-se no elemento Y. No fóssil que encontraram, metade é o elemento X, e a outra metade é o elemento Y. Isso quer dizer então que fazem exatamente 5000 anos que aquele animal morreu. Se 75% fosse o elemento Y, seriam 10000 anos, e assim por diante. Em alguns elementos, esse processo pode levar alguns minutos, e em outros, bilhões de anos. E isso é uma ótima forma de variar os relógios e ter uma medida mais precisa.
Esse é um ótimo relógio para medidas mais recentes, porém, para fósseis como os de Dinossauros, que já não guardam quase nenhum composto orgânico, pode ser complicado. Por isso existem outros tipos de relógios que podem ser usados. Um deles é a radioatividade das pedras.
As pedras também tem seus compostos químicos que obedecem a regras iguais as citadas acima. Mas seus processos são mais lentos do que os orgânicos. Assim, uma pedra do tipo certo pode “entregar a rapadura” e nos fornecer uma estimativa confiável de quanto tempo faz desde que ela se formou. No entanto, uma vez que nem todos os fósseis são encontrados em rochas que forneçam informações precisas (aliás, quase nenhum é), como eles fazem?
Simples: Primeiro, eles procuram por rochas do tipo certo na mesma camada de sedimentos do fóssil. Se encontrarem, problema resolvido. Caso não encontrem, eles podem apelar para a simples dedução do óbvio: Sedimentos mais antigos estão por baixo de sedimentos mais novos. Ou seja, se encontrarem uma rocha cujo a idade possa ser estimada acima da camada onde o fóssil foi encontrado, sabemos que ele é anterior a aquela época, e se encontrarem alguma abaixo dele, saberão que ele é mais recente, e então é só estimar o tempo médio... Em último caso, podem ainda comparar o padrão das rochas encontradas naquela camada de sedimentos com o padrão de rochas encontradas ao redor do mundo e puderam ser datadas, o que pode fornecer uma pista...
De um modo geral é uma tarefa trabalhosa, porém, não é necessariamente um segredo, algo incompreensível ou qualquer outra barreira que proíbam meros mortais de entender o processo. Portanto, só acredita na Terra de 10 mil anos quem quer...
Elo perdido? É você.
O registro fóssil de hoje em dia é consideravelmente amplo. Temos muitas evidências fósseis, conhecemos uma quantidade enorme de animais extintos através de seus registros, mas, obviamente, isso não representa nada comparado a quantidade enorme de vida que já passou pela Terra e não deixou vestígios.
crânio do australopiteco |
E isso sempre deixa margem para que os negadores da teoria da evolução repitam o seu mantra mais famoso: “Me mostre o elo perdido!”
Com isso, o que eles querem dizer, é que nos registros fósseis jamais foi encontrado um animal verdadeiramente intermediário entre duas espécies distintas. Eles alegam, por exemplo, que não há um animal intermediário entre o homo-sapiens e o australopitecos (um dos ancestrais mais antigos do ser humano, que no entanto ainda não é classificado no gênero homo). Ou ainda, que não foi encontrado um animal intermediário entre os dinossauros e as aves. São os chamados fósseis de transição que eles buscam. E que já foram, sim, encontrados diversas vezes.
O grande problema é que isso, da maneira como eles querem, é algo impossível de se encontrar, porque a evolução é muito gradual, lenta e progressiva. Para ficar em um exemplo claro, pegue uma foto sua de quando você era criança, uma de você mesmo na adolescência e outra foto sua na fase adulta. Compare. Você mudou muito nesse tempo. Mas você percebeu isso ao longo do processo? Provavelmente não. Assim como você não vê o ponteiro das horas do relógio se mover, mas ele se move...
Esse é o grande problema. O Archeopteryx é um fóssil que guarda perfeitas características similares entre aves e dinossauros, e é provavelmente uma parte completamente evidente do processo de evolução dessa linhagem. Mas é enquadrado ainda como um dinossauro pelos cientistas. Mas claro, por uma simples questão de nomenclatura (clique aqui para ver o quanto essa questão dos nomes vem causando problemas nos últimos tempos). Afinal de contas, ou o animal é enquadrado como dinossauro, ou é enquadrado como ave! O intermediário, obviamente, teria que ser enquadrado também em uma das duas classes... Mas para quem usa esse argumento, isso não importa: O Archeopterix é um dinossauro, e não serve como exemplo de intermediário.
Archeopteryx: Ave, dinossauro ou ambos? |
Se pudéssemos seguir toda a linhagem do Archeopteryx, veríamos que com o passar das gerações, pouco a pouco ele estaria mais e mais parecido com uma ave, mudando detalhes quase imperceptíveis a cada geração, assim como você mudou a cada dia sem perceber até se tornar um adulto... Até o momento em que ele seria, de fato, uma ave. E ai os negadores da teoria da evolução alegariam, com convicção, que esse animal era uma ave, e não mais um dinossauro... Entendem o problema? Eles se apegam a uma mísera questão de nomenclatura para negar os fatos, e não percebem que praticamente toda geração é formada de elos perdidos entre uma geração e outra.
Esse é apenas um exemplo óbvio, mas temos muitos fósseis de “intermediários” entre várias espécies. O tal “elo perdido” já foi encontrado vários vezes. Não está tão perdido assim. E do ponto de vista evolucionário, você mesmo é um dos muitos milhões de elos perdidos da nossa espécie... Só não vê, quem não quer.
Fazer um criacionista entender isso é que é o problema, negadores da evolução sempre vão se escorar nas lacunas que existem, o bom é que aos poucos todas as lacunas estão sendo preenchidas, cabe à eles aceitarem o fato de uma vez. Excelente texto, parabéns!
ResponderExcluirtexto incrível,com explicações esclarecedoras. dificilmente leio um texto do início ao fim, mas o autor conseguiu prender a minha atenção completamente. Parabéns!
ResponderExcluirMuito orbigado Joyce, fico muito feliz que tenha gostado!
ResponderExcluirComo sei que um fóssil é estágio evolutivo de outro e não apenas um outro animal diferente? Se daqui a milhares de anos alguém achar fóssil de mamute e elefante, vão dizer que um é evolução do outro ou que se trata apenas de dois animais diferentes?
ResponderExcluirBom, tecnicamente o animal "evoluído" por assim dizer é um animal diferente do outro. Não é como Pokémon em que seguem uma linhagem necessariamente direta. Por exemplo, chimpanzés e seres humanos são ambos animais que descendem de um antepassado comum, mas são 3 animais diferentes. O surgimento de humanos e chimpanzés não necessariamente significa que o antepassado deles precisaria ser extinto.
ExcluirQuanto a categorizar linhagens evolutivas, há algumas áreas da biologia que podem ser usadas para isso, como a cladística e a própria genética, por exemplo.